Os leitores deste blogue se recordam que escrevi,
durante o julgamento do mensalão, que o Supremo poderia preparar o Thermidor de
Lula.
Apenas
para recordar a ideia.
O Thermidor marcou um curso conservador da
revolução francesa, quando várias garantias democráticas criadas a partir de
1789 foram suprimidas. Até o direito do povo escolher seus governantes pelo
voto foi dificultado.
Guardando as imensas, quase insuperáveis distancias
geográficas e históricas, eu fazia uma analogia com o que se passa no Brasil
nos dias de hoje.
A partir da condenação de Dirceu, Genoíno e outros
personagens importantes do governo Lula, havia o risco de se abrir um curso
conservador na política brasileira.
Quero lembrar, claro, que não se pode impedir
mudanças políticas à direita ou à esquerda – desde que elas sejam autorizadas
pelo voto popular.
Todo poder emana do povo, que o exerce em nome de
seus representantes eleitos – diz o artigo 1 da Constituição.
Assim, quando a população deu a Lula e Dilma um
mandato para realizar o programa do PT, eles tinham todo direito de cumprir o
que haviam anunciado.
Da mesma forma, entre 1994 e 2002, Fernando
Henrique Cardoso realizou várias reformas na Constituição. Privatizou estatais,
abriu o monopólio da Petrobrás e assim por diante.
Certo?
Errado?
Não é este o debate. Tanto Lula como FHC tinham um
mandato popular para fazer as mudanças pretendidas. Quando era preciso
aprová-las no Congresso, o governo precisava correr atrás de apoio do
Legislativo.
Reportagem de Juliano Basile publicada pelo Valor
Econômico informa que a pauta de deliberações do Supremo para 2013 envolve
questões que dizem respeito a decisões de caráter político, que podem
interferir em decisões de Estado que refletem escolhas legítimas feitas por
representantes eleitos.
Por exemplo: a Confederação Nacional do Comércio
quer derrubar a lei 12.440, que exige uma certidão negativa de empresas com
dívidas trabalhistas para participar de licitações públicas. Não consigo
imaginar por que se poderia levar uma questão dessas para o Supremo – a menos,
claro, que se pretenda obter ajuda do STF para autorizar o calote no bolso dos
trabalhadores.
Sabemos que, do ponto de vista da população, a CLT
envolve um conjunto imexível – como diria um antigo ministro do trabalho – de
garantias para os assalariados. Ninguém se atreve a colocar esse debate em
plenário pela certeza de que será abandonado pelos eleitores na eleição
seguinte.
Há várias iniciativas desse tipo. São leis
aprovadas pelo Congresso que se pretende, agora, modificar – sem votos.
Questiona-se o controle sobre propaganda de bebidas
alcoólicas na TV e também a venda de cigarros com sabores e aroma – um recurso
da indústria para seduzir a juventude. Também se quer abolir a legislação do
áudio-visual que estabeleceu cotas para programação das TVs a cabo, definindo 3
horas e meia de programação nacional.
São alguns exemplos de um processo que levaram
Juliano Basile resume ao dizer que “intervenção estatal na economia será
julgada no STF.”
Já deu para entender qual é o assunto da
reportagem, vamos combinar.
Advogado da CNI, com causas no STF, Gustavo Amaral
esclarece: “não adotamos o discurso liberal de que o Estado não pode interferir
mas fazemos uma discussão sobre a qualidade dessa intervenção.”
É um debate pertinente, não há dúvida. Mas será que
um advogado tem o direito de querer definir o rumo da política econômica –
liberal, monetarista, desenvolvimentista, o que for – sem passar pelo crivo das
urnas?
Essa é a
questão.
O papel do Estado tem sido uma questão central no
debate eleitoral desde que as privatizações entraram na ordem do dia. Por que o
eleitor não pode resolver essa questão?
Nenhum comentário:
Postar um comentário