segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

A relação aluno-professor não é a mesma

A indisciplina e o desrespeito em sala de aula são as principais dificuldades que educadores enfrentam no cotidiano escolar


JOANICE DE DEUS_DIÁRIO DE CUIABA DIA 27 DE FEVEREIRO 2012
Da Reportagem

          A indisciplina e o desrespeito em sala de aula são as principais dificuldades que educadores enfrentam no cotidiano escolar. O problema sempre existiu, mas vem se agravando. Antigamente, o professor tinha status de autoridade e, quando falava, todos ouviam. Atualmente, parece não dispor mais do devido comando em sala de aula e enfrentam a falta de respeito, de interesse dos estudantes em relação aos conteúdos ministrados e até agressões físicas ou verbais.

          Aparentando cautela, profissionais da rede pública, em Cuiabá, reconhecem o problema. Porém, amenizam afirmando que os atos mais graves são raros, ao mesmo tempo em que citam fatos em que já foram vítimas de estudantes com comportamentos hostis.

          Este é o caso da mestre em Educação Raquel Loureiro, professora de Geografia da Escola Estadual Liceu Cuiabano, um dos mais tradicionais da Capital.

           Ela conta que uma aluna estava com celular ligado em sala (o que é proibido pelo regimento interno da unidade) e mostrava algo para os colegas. Advertida várias vezes, a estudante passou a desferir palavras de baixo calão contra a profissional. “Foi só uma vez e ocorreu há um ano”, afirma.

            Docente há 15 anos, Raquel faz uma espécie de retrospectiva sobre a situação. “Quando comecei a dar aula, o aluno tinha mais respeito e aceitava os comandos do professor. Hoje, estão sem limites, ganham livros, merenda, têm à disposição equipamentos de informática, laboratórios e outros recursos, até passe-livre recebem para virem à escola, mas para você conseguir que eles aprendam alguma coisa tem que fazer malabarismo”, diz, e acrescenta que se sente reconhecida e recompensada quando ex-alunos chegam a lhe agradecer pela sua maneira e atitude em sala de aula.

           De mesmo sentimento compartilha a professora de Inglês do colégio Nilo Povoas, Fátima Comini. Em seus 18 anos de profissão, inclusive na rede particular, Comini também reconhece que já sofreu agressão verbal, pelo menos uma vez.

          Porém, segundo ela, os alunos indisciplinados e que infernizam a vida de quem se dedica a ensinar ou transmitir o que sabe é a minoria. “O problema é que tem a história da maçã podre no cesto, que pode contaminar o restante. Por ser uma professora exigente, e se não for assim eles relaxam, a maioria acaba ouvindo a gente”, afirma.

          A docente considera a ausência dos pais um dos entraves para a melhoria na relação e para o avanço no processo ensino-aprendizagem. “Na rede privada há todo um sistema que cobra e acompanha. O aluno sabe que é cliente, acha que tem mais ‘poder’ (que o professor), mas acaba fazendo tudo porque é o pai quem paga e também cobra. Na escola pública, a presença dos pais é quase zero e o sistema educacional não acompanha e não funciona de acordo com a realidade”, criticou.

          No momento da entrevista, horário do intervalo, um estouro, semelhante à de uma bomba, ecoou pelo pátio e corredores do Nilo Póvoas. O artefato, do tipo traque, foi explodido no pátio inferior em meio aos alunos. Caso seja identificado, o responsável pode até ser expulso da unidade, o que é difícil de acontecer, segundo os professores.

           De acordo com o coordenador pedagógico do Nilo Póvoas, Donizetti Ribeiro, os conflitos mais frequentes na unidade referem-se ao ambiente escolar como um todo. “É aluno que chega atrasado e quer ficar perambulando pelos corredores ou que não quer desenvolver as atividades. Os desentendimentos com professores, aqui no Nilo, não são tão comuns”, afirma. Os casos mais graves são encaminhados para a coordenação, que faz o papel de orientar e intermediar o conflito. Os pais também são convocados e informados sobre o problema.

           Professor de História a 20 anos, dos quais 12 em unidades públicas, Ribeiro também reconhece que a relação entre docentes e alunos mudou. “Antes, a escola era o segundo lar para o aluno. O professor era considerado um segundo pai ou segunda mãe. Hoje, é outra realidade. Vivemos numa sociedade democrática e vivenciamos perdas de determinados valores. Assim, há alunos vivendo em clima de extrema liberdade em que os direitos não acompanham os deveres e alguns acham que sequer precisam desenvolver atividades em salas”, avaliou.



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